O ano de 2007 vai ser decisivo para o Kosovo. Continuará este a ser uma região da Sérvia, uma região com autonomia, um Estado de soberania limitada ou um verdadeiro País?O relatório de Martti Ahtisaari (enviado especial da ONU encarregue de dirigir as negociações sobre o estatuto final do Kosovo) propunha a instituição de um regime de soberania limitada para aquele enclave muçulmano. O Kosovo teria direitos de participação e representação internacional limitados, bem como entraves ao nível da constituição de forças armadas e de segurança. Teria igualmente de criar mecanismos de protecção da minoria sérvia que ainda habita o território.
Os sonhos de glória e engrandecimento da “grande nação sérvia”, e a acérrima defesa da identidade nacional (refira-se, a este propósito, a importância histórica do território) fizeram com que o Parlamento Nacional sérvio, dominado pelos nacionalistas, vetasse por larga maioria, a proposta de Ahtisaari.
Contrariamente, o grosso dos partidos políticos albaneses aceitou-a. Perante esta patente divergência de perspectivas e a mais que provável ausência de um acordo entre as partes, caberá ao Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) decidir a questão. Algo que parece muito fácil no papel, mas que na realidade terá consequências imprevisíveis para a estabilidade e a segurança dos Balcãs.
A União Europeia tem vindo a celebrar diversos convénios com a Sérvia. Esta é vista em Bruxelas como um Estado com potencial para vir a integrar o projecto europeu. Diversos programas de financiamento têm tido como alvo a região dos Balcãs (v.g. o TACIS e o instrumento de estabilidade) e a eurocracia tem vindo a desenvolver, nos últimos anos, uma Política Europeia de Vizinhança (PEV), que tem por objectivo manter a estabilidade (económica, política e securitária) nas suas fronteiras.
Pelo seu lado, os EUA, enquanto líder da NATO, não vai querer deixar de manter uma certa presença na região – especialmente agora que os europeus parecem poder vir a prescindir do apoio militar norte-americano, ao iniciar uma tímida Política Externa de Segurança e Defesa (PESD).
Os aliados de um e do outro lado do Atlântico procuram a estabilidade. Seguir o plano de Ahtisaari seria perfeito, mas na eventualidade de se depararem com muitas dificuldades, as potências ocidentais apenas procurarão evitar que a situação no Kosovo descambe, como em 1999, para um cenário de conflitualidade extrema. Nem que para isso a região tenha de ser sacrificada aos Sérvios, numa verdadeira política de contenção de danos.
E isto porque, como em 1999, os Russos parecem vir a assumir-se como a grande força de bloqueio no CSNU. Na Conferência de Munique sobre Segurança, que teve lugar há cerca de duas semanas, Putin afirmou peremptoriamente que iria utilizar o seu direito de veto e não aprovaria qualquer solução que não fosse primeiramente escrutinada por Belgrado. Esta posição radica nos laços históricos que ligam os dois países e na influência económico-política que Moscovo tem vindo a ganhar na sociedade sérvia, bem como no facto de Putin se ver, ele próprio, a braços com um incómodo movimento independentista na Tchetchénia.
Atendendo à notória dependência energética da UE face à Rússia, especialmente ao nível de fornecimento de gás natural; ao facto da NATO estar a procurar instalar sistemas anti-mísseis na República Checa e na Polónia, criando justificados receios russos e colocando em sentido o seu “estrangeiro próximo”; e às divergências sentidas para ultrapassar o impasse negocial sobre o programa nuclear iraniano, é possível que se verifiquem cedências da parte dos ocidentais às vontades de Moscovo. E em que é que estarão a UE e os EUA prontos a ceder?
A situação corre o risco de vir a ser tratada com paninhos quentes ou não ser de todo resolvida, para evidente desconforto da população kosovar albanesa.