Thursday, March 1, 2007

O tempora, o mores!

Por vezes sinto-me uma ave rara. Vi-me obrigado, como muitos jovens adultos da minha idade, a trocar as verdejantes pastagens de cabras e os irrequietos e transparentes ribeiros pelas florestas de betão e esgotos a céu aberto da grande capital do império. Ainda que, por vezes, se me acometam as mais pesadas saudades, principalmente quando regresso, um ou outro fim-de-semana à santa terrinha para recobrar forças e comer a papinha da mamã, tenho convivido bem com a minha nova condição de desterrado. A única coisa que por vezes entristece é sentir-me um estrangeiro no meu próprio país.

Desde que vim para Lisboa tem acontecido de tudo. Se peço um "fino" em vez de uma "imperial" recebo piadinhas do estilo: "-e já agora também não quer um pires de tremoços?". Se digo afiadeira em vez de apára-lápis, cai o Carmo e a Trindade e se me lembro de afirmar, a plenos pulmões, que sou apoiante do FCP, temos um maremoto de 9.0 da escala de Richter. O lisboeta médio é um ser superficial. Pouco viajado, tem a mania que vive no centro do mundo. Zomba dos sotaques, dos regionalismos linguísticos e das outras formas de estar na vida, sem ter em atenção o que isso significa em termos de riqueza cultural de um povo. Naquilo que os outros vêem uma expressão cultural, o lisboeta médio vê, do alto da sua torre de marfim, a ignorância, a idade média e o conservadorismo retrógrado.

Se não vai ao ginásio a seguir ao trabalho e não tomar um café no bar mais in da capital não se é fixe. Se não frequentar o S. Carlos às Quintas e os concertos da Gulbenkian às Sextas é-se virtualmente incapaz. E se não for às inaugurações das exposições de pintura mostrar o novo fato Armani, roça a ineptidão social. Numa sociedade completamente centrada no culto da imagem, onde as virtudes ardem nas fogueiras das vaidades bom é ser egoista, maledicente, competitivo e fazer as coisas não por que se gosta, mas para dar uma imagem, nem sempre real, daquilo que (não) somos.

Se ser conservador e retrógrado é saber onde passa o rio Mondego, é beber uns copos em alegre companhia, é prezar os valores tradicionais, é compreender as diferentes formas de ser e de estar que pululam neste nosso rico e pequeno país, é pensar mais nos outros que em nós próprios, é ser tolerante, então eu quero que o tempo pare... Ou comece a andar para trás.